segunda-feira, 23 de setembro de 2013

A raposa e as uvas verdes do petróleo

 
No final de semana, multiplicaram-se as matérias sobre as razões de as empresas americanas e inglesas terem fugido do leilão de Libra.  Nem uma palavra para falar das verdadeiras razões

Por Fernando Britto, do Tijolaço.

A incapacidade de raciocinar a profundidades maiores que cinco centímetros parece ter se tornado uma praga no jornalismo nacional. No final de semana, multiplicaram-se as matérias sobre as razões de as empresas americanas e inglesas terem fugido do leilão de Libra: modelo de partilha é desconhecido, há muita interferência estatal, a presença da Petrobras como operadora incomoda e por aí vai.

Ah, e ainda tem a brilhante conclusão do Estadão que, através de uma pesquisa nos sites das petroleiras chegou à conclusão de que elas não se interessam pelo pré-sal brasileiro – imagina se iam publicar ali os lugares onde tem olho grande. Publicam onde estão, porque todo mundo sabe que estão, mas não onde querem estar, óbvio.

E como pode ser desconhecido o modelo de partilha se ele é praticado por mais da metade dos maiores produtores mundiais de petróleo? Muito menos é problema a operação do campo pela Petrobras, porque todas elas já compraram interesses em campos operados pela brasileira. O chororô que “vazam” para os jornalistas é o gemido triste da raposa dizendo que “bem, aquelas uvas não prestavam mesmo, estavam verdes”.

Nem uma palavra para falar das verdadeiras razões. Que são duas, e se interligam. A primeira e óbvia foi a situação canhestra em que ficou o governo americano – do qual as empresas americanas e inglesas, todos sabem são irmãs siamesas – com a revelação da espionagem sobre a Petrobras. Qualquer investida mais ousada para deter o controle do campo seria vista como resultado de informação privilegiada. E, cá pra nós, seria mesmo.

Segundo, impossibilitadas politicamente de forçar a Petrobras a um acordo, sabem que teriam de subir seus lances, porque a brasileira está articulando uma composição com os chineses. E lances altos, num leilão de partilha, quer dizer uma parte maior para o governo brasileiro. No leilão de Libra o esquema de participação fica como exposto no quadro ao lado, com pequenas variações em função do volume produzido e do preço internacional do petróleo.

Lembre que como estamos falando em um volume recuperável de óleo em torno de 10 bilhões de barris, a 100 dólares cada um, cada um por centro equivale da 10 bilhões de dólares, ao longo de 35 anos.
 


E estas percentagens estão longe de serem as mais altas exigidas no mundo: em alguns países, como a Indonésia, elas chegam a passar de 90%, pela exigência de venda a preços mais baixos para o mercado interno. Nem por isso as grandes fogem de lá.

Nossa imprensa, porém, não mostra isso a seus leitores.

Está mais  preocupada com as pobrezinhas das multinacionais do petróleo, tão generosamente dispostas a nos ajudar a tirar o óleo de lá das profundezas, está perdendo com estas “regras absurdas”  que fazem a receita ficar com o país. Alguns agem por servilismo, mesmo. Mas a maioria é por incapacidade de pensar mesmo, que os faz repetir como papagaios os que as vedetes da imprensa dizem.
 
Por sorte, há exceções e vale a pena registrar uma, de Jânio de Freitas, na Folha de ontem: “Vista pela ótica da história das relações internacionais, as americanas Exxon (ainda Esso, para nós) e Chevron e as britânicas BP e BG fizeram uma gentileza ao Brasil, com sua desistência de participar dos leilões do pré-sal. Preferem investir para a desnacionalização do petróleo mexicano.
 
As três primeiras são o que se pode definir como empresas geradoras de problemas, onde quer que estejam. A Exxon ou Esso ou Standard Oil tem um histórico de presença no centro de conflitos armados, inclusive entre países, sem equivalente. E seus interesses sempre se tornaram interesses do governo americano, para todo e qualquer efeito. Passem bem todas quatro, o que não acontecerá ao México.”
 

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