terça-feira, 27 de setembro de 2011

OS ESPECIALISTAS E O CÂMBIO



A anguzada, como dizia meu avô, da última semana no mercado cambial teve aspectos cômicos. Alguns "especialistas" recusaram-se a ouvir o dr. Tombini sobre a possibilidade de movimentos cambiais insuspeitados. Continuaram a defender, como paradigma para medir as "distorções" de nossa pobre e ignorante política cambial, a absoluta liberdade do movimento de capitais e o sagrado regime de flutuação imaculada e desinibida da taxa de câmbio.

Tudo de acordo com o Mundo 2, do platonismo semiacadêmico no qual habitam. De repente, trombaram com o Mundo 1, da cruel realidade aristotélica. Foram surpreendidos numa desconfortável posição "vendida" no mercado altamente volátil antecipado pelo dr. Tombini.

Para safar-se, precisam de tempo (o que impõe custos) e de liquidez (que se tornara escassa pela ação do IOF). Clamaram, então, por uma imediata e eficaz intervenção do Banco Central no mercado. Ela está sendo feita (como, aliás, é obrigação do Banco Central), mas agora, obviamente, não se trata de uma "distorção"...

O ponto mais interessante é que tais operadores atribuem suas dificuldades não à arriscada busca de lucro num mercado absolutamente imprevisível, mas às medidas que, "em legítima defesa", o governo tem posto em prática apenas para confortar parte da indústria nacional, à qual ele mesmo tem negado, há décadas, as condições isonômicas para competir. Para encerrar esse assunto, nada como lembrar o velho Nietzsche: "A grande vantagem da falta de memória é que podemos gozar muitas vezes, sempre pela primeira vez, as mesmas boas coisas".

Talvez esse seja o momento de reconhecer a validade da hipótese básica que orienta a nossa política econômica (fiscal, monetária e cambial): o mundo caminha para alguns anos de alta volatilidade e baixo crescimento. Não apenas porque os Bancos Centrais não sabem bem o que fazer, mas porque há uma "conjugação desfavorável" dos astros! A reedição da operação "twist" pelo Fed, depois do seu reconhecido fracasso, em passado não muito distante, é uma prova disso.

De um lado, temos nos EUA uma disfuncionalidade política que nunca foi tão evidente e que não será resolvida antes das eleições de 2012. É pouco provável que o último apelo de Obama ("Living Within Our Means and Investing on the Future: The President´s Plan for Economic Growth and Deficit Reduction"), que inclui o "The American Jobs Act", seja aprovado no Congresso pelos republicanos.

Se aprovado, talvez não venha a tempo para reduzir, antes da eleição, o dramático desemprego e subemprego; dar conforto aos 16% da população sem assistência à saúde; melhorar a renda das residências americanas (no menor nível desde 1996) e compensar mais de US$ 6 trilhões de redução de ativos que elas sofreram desde 2007.
Por último, mas não menos complicado: 47% dos cidadãos são hoje dependentes, de uma forma ou de outra, de alguma ajuda do governo, o nível mais alto registrado na história dos EUA. Não podemos esquecer que Obama sequer conseguiu nomear os dois membros faltantes do Fed.
Por outro lado, temos enormes dificuldades na Comunidade Econômica Europeia onde, também, o Banco Central não revela que sabe muito mais do que o Fed. A situação não melhorará enquanto não se completar a substituição de Jean-Claude Trichet pelo novo escolhido, o competente, experiente e pragmático Mario Draghi.

Ele assume sob a suspeita dos puristas monetários do Bundesbank, que têm abandonado, oportunistamente, a direção do Banco Central Europeu, depois das sucessivas derrotas de Angela Merkel a cada eleição regional. Draghi deve dizer a que veio, porque na opinião de economistas alemães, "para os italianos, a inflação é uma forma de viver, como o molho de tomate no espaguete"...

Provavelmente Merkel vai perder as eleições. O vencedor vai ter que ensinar aos seus economistas que "a política domina a economia". O país que mais vai perder, política e economicamente, no curto prazo, com a eventual destruição da moeda única, o euro, é justamente a Alemanha. Basta pensar quem estaria hoje na posição do franco suíço, se o deutschemark ainda existisse. E o que seria da prosperidade da Alemanha, se as suas exportações não tivessem se beneficiado da disciplina germânica que "desvalorizou" o deutschemark dentro do euro, aumentando a produtividade da mão de obra, ao mesmo tempo em que, de acordo com os sindicatos, controlava o aumento dos salários. Em outras palavras, a civilizada política alemã de trocar a "estabilidade" no emprego pela "moderação" salarial foi induzida pelo euro.

Com a visível escassez de estadistas que se abate sobre o mundo desenvolvido, o tempo da recuperação é absolutamente incerto. Não se trata apenas de um problema econômico, que os economistas talvez soubessem resolver, mas de um problema político, que os economistas, mesmo que soubessem o que fazer, não poderiam fazê-lo. Falta-lhes a legitimidade do poder. Trata-se de uma questão de liderança capaz de devolver à sociedade a confiança e a esperança, sem as quais não se vê solução razoável antes das próximas eleições nos EUA e na Eurolândia. Esperamos vê-las depois...

Antonio Delfim Netto é professor emérito da FEA-USP, ex-ministro da Fazenda, Agricultura e Planejamento. Escreve às terças-feiras

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

MAIS UMA DA gLOBO

Do Blog do Mello: O Globo comete ato falho



No rasto da recente manifestação "contra a corrupção" (mas que só vê o lado dos políticos corrompidos e nada diz sobre os empresários e lobistas corruptores) em Brasília, o jornal O Globo abriu espaço para a empresária Cristine Maza, que o jornalão apresenta como "uma das organizadoras do evento [contra a corrupção, que deve acontecer no Rio] que já conta com a adesão de cerca de 26 mil pessoas no Facebook".


Só que o jornalão comete um ato falho (mais apropriadamente um lapsus linguae) e afirma que Maza é uma das cinco pessoas por trás do movimento Todos Juntos PELA Corrupção.
Realmente, empresários costumam se beneficiar da corrupção, mas O Globo não precisava escancarar, né?
Confira a imagem abaixo, retirada da página de O Globo na internet (Aviso: o mesmo erro está na versão impressa do jornal, na página 4 do primeiro caderno [conferi]).
Leia mais aqui.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

PREFEITO NOMEIA ESTELIONATÁRIO COMO DIRETOR DA MATERNIDADE‏ DE ALAGOINHAS



Alagoinhas: prefeito admite Incompetência como gestor, após nomear um estelionatário para Diretor Geral do Hospital Maternidade, e que em seu governo não avalia indicaçaões.
O vereador Luciano Sérgio (PT), do município de Alagoinhas, alertou a imprensa e autoridades sobre o histórico do recém nomeado diretor do Hospital Maternidade da cidade, Giovani  Luís Teodoro Machado. A contratação data de 1º de setembro deste ano. De acordo com documentos apresentados pelo edil, Machado é acusado de estelionato e furto qualificado em pelo menos quatro estados (São Paulo, Minhas Gerais, Piauí e Rio Grande do Sul), além do Distrito Federal.

Em contato com a reportagem do Bocão News, o vereador disse que na manhã desta quinta-feira (15), foi procurado pelo secretário de governo da prefeitura, João Rabelo, que lhe deu duas informações sobre o caso. A primeira, de que o novo diretor já havia sido exonerado. A segunda é que Machado teria sido indicado pela secretária da Saúde, Telma Pedrão Costa Mota.
“Ele (João Rabelo) me disse que o prefeito, Paulo César Simões Silva (PDT) exonerou, mas não me apresentou nenhum documento provando. Acredito que isso ( a demissão) deve ser publicada amanhã no Diário Oficial com data retroativa”, disse.

Questionado pela reportagem deste site, o prefeito Paulo Simões se mostrou irritado com a situação. “Para encerrar a conversa, ele (Giovani Luís) já foi exonerado”. O novo membro do partido fundado por Brizola argumenta que seria difícil “imaginar um homem bem apresentável com um currículo bom. Não tinha ideia de todas as acusações”.

Sobre uma possível investigação que deveria preceder a contratação de um profissional para dirigir uma maternidade, Paulo César disse: “se for para investigar a vida de todos os indicados em órgãos públicos ninguém mais trabalha”.

domingo, 11 de setembro de 2011

"EUA têm mais inimigos hoje do que tinham em 2001"

Em entrevista à Carta Maior, François Bernard Huyghe, professor de Ciências Políticas e pesquisador no Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (IRIS), analisa os dez anos transcorridos desde os atentados de 11 de setembro de 2001. Autor de vários ensaios sobre o terrorismo, o especialista francês destaca a relação entre mídia e terror, a permanência da ideologia conservadora nos EUA e o erro estratégico que Washington cometeu ao responder ao terror com um terrorismo de Estado.
Eduardo Febbro - Correspondente da Carta Maior em Paris
Uma década depois das imagens das Torres Gêmeas de Nova York caindo como castelos de areia as análises dos especialistas são contrastadas: Bin Laden não ganhou, mas tampouco os Estados Unidos. Em meio a isso, eclodiram as revoluções árabes e estas, em um mesmo movimento, desacreditaram tanto as teses do radicalismo islâmico como a vergonhosa posição dos países ocidentais que apoiaram, em nome de seus interesses, os piores déspotas da história. Professor de Ciências Políticas, pesquisador no Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (IRIS), autor de vários ensaios brilhantes sobre o terrorismo, François Bernard Huyghe analisa nesta entrevista os dez anos transcorridos.
Em seu último livro publicado na França, “Terrorismes, violences et propagande”, François Bernard Huyghe faz uma análise histórica do terrorismo. O autor destaca nesta entrevista o papel dos meios de comunicação, a permanência da ideologia conservadora norteamericana e a forma pela qual, por meio da “guerra ao terror”, a primeira potência mundial recorreu ao terrorismo de Estado ao melhor estilo de Pinochet, no Chile.
Dez anos depois do 11 de setembro fica no ar algo como um balanço nefasto, tanto para os seguidores da Al-Qaeda quanto para os Estados Unidos. As revoltas árabes que estouraram em 2011 são uma poderosa negação das teses da Al Qaeda e, ao mesmo tempo, desmascaram o cinismo ocidental.
A primavera árabe se inscreve em uma lógica oposta às ideias da rede de Bin Laden. Para a Al Qaeda, os muçulmanos tinham só duas opções: submeter-se ao Ocidente ou a ditaduras pró-ocidentais como a de Mubarak no Egito; ou se comprometer com a Jihad, a guerra santa, e combater. Mas nos damos conta de que existia ao menos uma terceira alternativa, a saber, a das revoluções democráticas. Hoje estamos então em uma nova fase na qual a Al Qaeda e a nebulosa jihadista esperam aproveitar-se da primavera árabe segundo um esquema clássico. Contam com que a revolução popular e pacífica gere decepções, que haja desordens e tentativas reacionárias. A partir daí, os elementos mais duros jogarão a carta da radicalização da situação com a ideia de passar daí para a luta armada. Esse é o esquema que se depreende das ideias de Al-Zawahiri.
Por outro lado, Hosni Mubarak no Egito e Ben Ali na Tunísia agitaram o fantasma da Al Qaeda e com isso reprimiram a população ao mesmo tempo em que diziam ao Ocidente: “estamos do seu lado, lutamos contra os islamistas”. Chegamos assim ao assombroso paradoxo de ver os EUA felicitarem-se ante a maravilhosa revolução democrática no Egito quando, na verdade, até apenas alguns meses atrás Washington despejava bilhões de dólares no Egito de Mubarak.
Outro dos grandes paradoxos do 11 de setembro reside em que os atentados serviram mais aos interesses da ideologia neoconservadora norteamericana do que aos interesses do mundo árabe.
Para os neoconservadores dos EUA, os atentados do 11 de setembro foram uma surpresa divina. Os atentados deram aos conservadores o argumento ideológico para justificar os planos que já tinham prontos, como a invasão do Iraque por exemplo. Esse argumento consistia em dizer que os EUA não eram um tigre de papel, que podiam utilizar a força e inclusive impor a democracia pela força no mundo árabe. Eles aproveitaram a ocasião para vivificar o país preconizando valores militares, de disciplina, de ofensiva.
Os neoconservadores se apegaram à locomotiva do 11 de setembro e conseguiram com isso uma influência ideológica incrível. Aproveitaram-se da situação, da personalidade do presidente Bush. Para eles, o 11 de setembro foi um pão abençoado. E creio que, ainda hoje, não estão fora do jogo. Podem voltar nas próximas eleições presidenciais e, contrariamente ao que pensam muitos analistas, os neoconservadores não estão descontentes com Obama. Eles aprovaram a decisão de enviar 20 mil soldados adicionais ao Afeganistão. Para a Al Qaeda, o fato de a primeira potência do mundo, os EUA, ter declarado guerra e apontado a rede como seu principal inimigo foi um tipo de felicidade paradoxal.
De alguma maneira continuamos mergulhados nas duas ideologias, a que Bush colocou em prática como resposta a Bin Laden.
Sim, essa corrente ideológica persiste. Por exemplo, um mês depois do assassinato de Bin Laden, Barack Obama firmou uma enésima doutrina contra o terrorismo na qual o enunciado principal segue sendo “estamos em guerra contra a Al Qaeda”. A obsessão de um segundo 11 de setembro, a prioridade que se deu à ação para eliminar os terroristas e suas redes assim como os regimes que os apoiam não desapareceu. O discurso de Obama, obviamente, é diferente. O presidente diz que é preciso agir respeitando certos valores e Obama não adotou um regime jurídico excepcional como o Patriot Act.
O terrorismo ao estilo Bin Laden também inaugurou uma indústria mundial dos meios de comunicação, uma espécie de frenesi comercial de comentaristas, analistas e canais de televisão que se ocuparam de propagar a legitimidade da chamada “guerra contra o terror”.
Sim, é certo, mas essa é também uma das regras do terrorismo: o terrorismo é também um meio de comunicação. Se os meios de comunicação não existissem, se os meios não afetassem o imaginário das pessoas, o terrorismo não existiria. O atentado contra as torres gêmeas foi o acontecimento mais filmado da história da humanidade. O terrorismo vive graças ao impacto que tem nos meios de comunicação. Antes, nos anos 70, os terroristas eram obrigados a ser apoiar nos meios de comunicação inimigos, nos meios do capitalismo digamos, para que suas ações fossem difundidas. O que mudou hoje é a aparição da internet. Hoje há redes sociais islâmicas, portais islâmicos, revistas virtuais islâmicas e produtoras islâmicas. Os terroristas têm também seus próprios meios de comunicação.
De um 11 de setembro a outro, o do golpe de estado de Pinochet no Chile e o dos atentados de 2001, encontramos uma constante: o Estado chileno recuperado por Pinochet levou a cabo no Chile uma repressão semelhante a que Bush implementou em escala mundial na chamada guerra contra o terror. As violações de direitos humanos que vimos no Chile, Argentina, Uruguai e Brasil se reencarnaram mais tarde nas práticas da primeira potência mundial.
É certo que como resposta às guerrilhas houve um terrorismo de Estado na América do Sul. Trata-se de uma lógica clássica na qual grupos minoritários obrigam o inimigo a mostrar seu verdadeiro rosto, desmascarando-o para mostrar que é sanguinário. Quando os Estados se veem confrontados ao terrorismo, aplicam suas próprias leis, adotam medidas, proclamam um estado de exceção e, assim, entram em uma fase repressiva que, às vezes, os leva a eliminar poucos adversários e a ter mais inimigos do que antes.
Os Estados se vêm tentados a recorrer a práticas condenáveis: prisões secretas, torturas, repressão, interrogatórios. Todos os Estados caem na tentação de responder à provocação terrorista com um terrorismo de Estado. É isso o que vemos com a reação dos EUA depois dos atentados de 11 de setembro: imagens de guerra terríveis, a prisão de Guantánamo e todo o dispositivo que foi posto em marcha com o Patriot Act. Com esse esquema, os EUA fizeram mais inimigos do que os que tinham no dia 10 de setembro à tarde. É um erro enorme do ponto de vista estratégico.
Tradução: Katarina Peixoto

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